segunda-feira, 9 de agosto de 2010

CONTEÚDO DESSE BLOG:

Introdução

Capítulo I – O punk e o anarquismo

Capítulo II- Choque cultural e o padrão oculto

Capítulo III – Contracultura e ação

Capítulo IV – Manifestações e organização prévia

Capítulo V – Estudos e propostas

Capítulo VI – Sobre centralização e sectarismo

Capítulo VII – O punk e suas visões distorcidas

Capítulo VIII – Sobre drogas e consciência

Capítulo IX – A ruptura com o preconceito

Capítulo X – As mulheres punks e as questões feministas

Capítulo XI – A sociedade leiga X imediatismo na militância

Capítulo XII – Libertação humana e animal

Capítulo XIII – A busca por cultura e o mundo diverso

Capítulo XIV – O ideal libertário nos dias atuais

Capítulo XV – A consciência além do punk

INTRODUÇÃO

Em diversos cantos, de diversas bocas, ouvem-se as tão famosas frases “o punk está morto”, “o punk é uma moda”, “o punk virou algo comercial”, entre tantas outras que poderiam soar desembasadas, não fossem alguns conflitos internos dentro do movimento punk no contexto atual.

Sabe-se que o punk é contestação, é ação, é consciência, é respeito mútuo, é a diversidade de culturas... Mas, na sociedade contemporânea, o que o punk contesta? Quais são suas ações? O que o punk tem por consciência em seu plano de ação? Há, de fato, o respeito mútuo? E quanto a diversidade de culturas, em quais delas o punk se identifica ou se espelha?

Devemos nos atentar a uma série de questões que ultrapassam a visão de muitos militantes, já que lidamos com uma sociedade não habituada a ideias libertárias, onde pessoas não conseguem enxergar o quão violados estão seus direitos.
É necessário um plano de ação, uma consciência acerca de questões delicadas, é necessário rever e repensar muitas atitudes, pois a evolução pessoal é tão importante quanto a revolução social.

Neste documento, pretendo abordar algumas dessas questões e propor novas formas de lidar com a sociedade e com a militância enquanto punk.
Esse documento sugere a reflexão sobre o que cada punk, em seu íntimo, traz consigo para contribuir com a luta pelas liberdades.

Espero, dessa forma, contribuir e ampliar o diálogo entre os punks, aumentando a interação entre todos os militantes.

ÊRA PUNK! Paz e Consciência!

Mao Punk

CAPÍTULO I – O PUNK E O ANARQUISMO


O punk como movimento surgiu em meados dos anos de 1970, com claro contexto de oposição aos padrões vigentes, que aprisionam as pessoas em um sistema de escravidão estética, moral, social, política e comportamental. O punk é justamente a ruptura com essa escravidão. É a liberdade de cada indivíduo em ser o que quiser, livres das amarras do sistema capitalista. Tendo em vista estes intuitos, percebe-se claramente a tendência anarquista no comportamento punk, embora não seja um fator condicional (há punks de outras tendências políticas dentro do espectro do socialismo ou mesmo punks que não assumem uma tendência política específica, carregando apenas a oposição às autoridades).

Porém, é necessário compreender que o punk e o anarquismo são coisas distintas, que podem se encontrar (e frequentemente se encontram) como complemento de cultura e ação.

O anarquismo como ideia e postura política teve início quando o francês Pierre-Joseph Proudhon se auto-proclamou anarquista. Ele foi a primeira pessoa a defender o anarquismo como postura política e deu força às ideias anarquistas com seus escritos, dentre os quais “Que é Propriedade”, publicado em 1840. Nessa publicação, ele atacava a propriedade privada como sendo a base das desigualdades sociais e defendia novos meios de produção sem exploração, tema que anos mais tarde foi abordado e aprimorado por outros anarquistas como Bakunin e Malatesta, entre tantos outros.

Sendo o anarquismo uma filosofia e movimento de libertação social, o punk adotou, em grande parte de sua existência e até os dias de hoje, a postura anárquica, firmando-se como libertário por essência, embora haja controvérsias e/ou divergências. 

Pode-se dizer que o punk é a contestação cultural contra os padrões vigentes, por meio de um visual que confronta o estabelecido, por meio de informativos independentes, livres de manipulação midiática, por meio de música anticomercial e por um pensamento de liberdade. Já o anarquismo adotado por grande parcela dos punks, é o lado da ação, do protesto, das manifestações políticas. Sendo assim, torna-se quase impossível não associar o punk ao anarquismo, já que o punk propõe mudanças sociais e o anarquismo é justamente uma ferramenta para a libertação social contra o atual sistema vigente que frequentemente converge com a forma como muitos punks enxergam o mundo. 

CAPÍTULO II – CHOQUE VISUAL E O PADRÃO OCULTO

Uma das características do punk – talvez a mais evidente – é o visual que nos remete a um choque estético. Roupas velhas simbolizando a luta anticonsumista, moicanos simbolizando a guerra contra o sistema capitalista, coturnos mostrando uma postura antimilitar (pois todos são capazes de se “policiar” sozinhos e em cooperação, sem a necessidade de uma entidade estatal para isso), os cadarços coloridos sugerindo diversas ideias que o punk abarca, patches costurados em roupas propagando ideias e bandas da contracultura (cultura alternativa), entre outras peculiaridades.

Sem dúvida, o punk quebra com os padrões que nos são impostos pela televisão, pelas revistas e por vários canais que contribuem com o massacre capitalista. Mas, não teria o punk se uniformizado nessas características tão peculiares? Na minha visão, não!

Enquanto o visual punk chocar, então será uma prova de que a sociedade ainda carrega em si preconceitos e moralismos moldados e impostos. Torna-se necessário dizer que nem todo punk usa visual e muitos buscam formas alternativas de se vestir, para que o punk continue sua autonomia em ser o que quiser, sempre respeitando as diversidades.

Infelizmente, o que acontece tantas e tantas vezes, é o desrespeito de punks para com outros punks e de punks para com outras pessoas.

É comum ver brigas por conta de “tal punk usar tal acessório”, “tal punk usar tal cor” entre outras idiotices. O que importa, afinal, não é a união e a quebra de padrões? Então para que essas brigas que não levam a nada e só criam separatismo dentro do movimento?

E o pior de tudo são preconceitos com outras formas de se vestir. Pessoas que se dizem punks, antipadrão, mas que ao ver algum estilo alternativo, por exemplo, são os primeiros a criticar e tirar a liberdade do próximo. Onde esses “punks” querem chegar com tanta hipocrisia e mediocridade? Se somos contra padrões e a favor das liberdades, por favor, não tirem a liberdade dos outros e não tentem criar um novo padrão de como se vestir ou não se vestir. Nossos inimigos são as grandes empresas exploradoras, o governo, o Estado; não as pessoas que fazem parte da massa. No mais, devemos conscientizar a população, nunca impor ou apontar o dedo na cara de alguém. Muitas vezes, aliás, na maioria das vezes, as pessoas nem fazem ideia de que estão colaborando com o sistema tal como ele é. Conscientização, sim! Imposição nunca!

Façamos o choque cultural e respeitemos tantos outros visuais, afinal, a proposta do punk é justamente a liberdade e o respeito às diferenças. Se nós formos sensatos o bastante para entender as diferenças e conscientizar a respeito dos costumes atuais que dilaceram o indivíduo, então as pessoas respeitarão mais o punk, tal como queremos ser respeitados.

CAPÍTULO III – CONTRACULTURA E AÇÃO

O punk é contracultural. Isso não significa ser anticultura, é justamente o contrário! Contracultura é uma cultura alternativa, livre das imposições, uma cultura autônoma. Sendo assim, o punk defende a diversidade cultural e o livre acesso a informações, livre de monopólios e manipulações.

Uma das manifestações contraculturais do punk são as “gigs” – eventos onde os punks tocam suas músicas anticomerciais e trocam informações.

As gigs são importantes eventos para os punks, pois é onde podem confraternizar, divertir, obter novas ideias, trocar materiais e manter a cena contracultural viva.

Mas o que vemos é a falta de interesse de muitos punks em acompanhar todos os atrativos que as gigs muitas vezes oferecem, como por exemplo oficinas, palestras, debates, etc. Muitos esperam apenas a hora do show, da música ao vivo, esquecendo que não é só de música que uma gig é feita. É importante prestigiar tudo o que a gig oferece para que se aprenda mais a respeito do próprio movimento, para que haja a manutenção de informações, para que cresçamos como militantes políticos libertários.

É importante não se fechar apenas em gigs, mas também buscar informações em diversas áreas, em diversas culturas diferentes, para que haja um diálogo entre diferentes ideias, ajudando a interação entre a população.
 
Somente interagindo com outras artes e outros eventos é que construiremos uma sociedade de apoio mútuo, interação e respeito.

CAPÍTULO IV – MANIFESTAÇÕES E ORGANIZAÇÃO PRÉVIA


Os punks não vivem apenas de gigs, pelo menos ainda existem focos de militantes que se importam com a propagação da ideia e com a ação direta em seus diversos aspectos.

Sair nas ruas em passeatas e manifestações é outra característica dos punks. Infelizmente, parece que não são todos os punks interessados em construir algo através de protestos de rua e, em certos casos, muitos dos que comparecem a esses atos fazem questão de não respeitar o consenso, partindo para atos desnecessários e desconexos com a manifestação em si.

Lamentavelmente, isso se deve ao fato de que os próprios punks não estão se organizando como poderiam.

O movimento punk se engaja em diversas lutas sociais, como por exemplo nas jornadas em memória do dia 1º de maio de 1886, quando houve uma greve geral em Chicago por melhorias trabalhistas. Outro exemplo é a luta operária das mulheres do dia 8 de março de 1857, quando estas reivindicavam seus direitos nas fábricas e foram brutalmente assassinadas, trancadas dentro da fábrica e queimadas vivas. Podemos ainda citar o dia 7 de setembro, quando o Bra$il comemora a farsa da independência e xs manifestantes saem às ruas para alertar que ainda vivemos sobre influências tanto externas quanto internas, numa dependência que gera desigualdade social e guerras entre nações.

Tudo isso é de extrema importância para a emancipação social e para a construção de um mundo mais ameno e justo. Mas falta organização entre os punks para que se possa realmente construir coisas produtivas.

Citando o movimento da cidade de São Paulo, geralmente essas passeatas – mais especificamente nessas datas citadas acima – acontecem no centro da cidade. Muitas vezes, a concentração de manifestantes acontece espontaneamente, sem uma organização prévia de como seguir com a manifestação. Sabendo-se que nessas datas sempre há concentração de punks e anarquistas pelo centro, tornou-se praticamente um encontro anual/periódico de militantes, sem propostas de novas ideias e de novas ações. Alguns saem de casa nessas datas simplesmente porque sabem que irão encontrar outros punks/anarquistas pelo centro. Chegam ao local de concentração sem ao menos saber o que será feito durante a passeata.

Faltando embasamento e diálogo para realizar as passeatas, é comum que as ideias de cada militante entrem em divergências, o que significa uma manifestação disforme, já que durante a ação torna-se quase impossível entrar em um consenso entre todos os participantes.

É necessário um amplo diálogo entre os militantes, uma organização antes das passeatas, para que se decida em consenso a rota, as formas de propagação, os materiais etc. Dessa forma, as chances das manifestações saírem do controle dos militantes diminuem bastante.

Outra coisa importante a se observar é o tipo de ação direta que será empregada nesses atos. Nem sempre a depredação de estabelecimentos privados se torna válida. É importante manter um foco! Se estamos manifestando pela conscientização do voto nulo, por exemplo, não há um motivo que legitime o ataque destrutivo ao patrimônio estatal (a não ser que haja realmente um contexto para essa ação e esse contexto esteja dentro do consenso entre os manifestantes). Que fique claro, o que estou dizendo não é que não devemos atacar da forma que se fizer necessário, o Estado repressor e seus símbolos. Ele deve sim ser combatido, das formas que forem necessárias. No entanto, como militantes, devemos ter visão de quando é o momento para se agir radicalmente e quando devemos ter uma postura mais cautelosa, afinal, se queremos nos unir ao povo e apagar a imagem deturpada que a mídia farsante expõe sobre o punk, é necessário que tomemos cuidado com nossos atos, para que possamos atrair mais pessoas em nossa luta. Assim poderemos, juntos, acabar com as repressões sociais e caminharmos todos por um mesmo fim: a extinção da exploração e das desigualdades.

Como nós, punks, representamos a luta do povo de todos os cantos, de todos os lugares, é importante não realizar as passeatas e ações somente nos centros das cidades, como acontece geralmente em São Paulo. É necessário que aconteça, simultaneamente, passeatas em todos os cantos da cidade, no centro, no subúrbio, nas periferias, principalmente em zonas carentes de informação. Não só passeatas, mas panfletagens, colagens de lambe-lambes (cartazes), distribuição de fanzines (informativos independentes), debates, eventos direcionados à comunidade, etc. Se a luta ficar apenas concentrada no centro ou apenas em um único ponto da cidade, então nós como militantes não estaremos fazendo nosso papel, que é passar informações e conscientização para todos os cantos e para quantas pessoas for possível.

Outra coisa importante para se dizer a respeito das ações, é que elas não podem acontecer apenas em datas óbvias. A luta é diária e a organização também deve ser! É necessário ação todos os dias, propor novas manifestações e eventos sempre que possível, difundindo assim o ideal libertário.

Ampliemos nosso campo de ação, organizemos com antecedência nossas passeatas, respeitemos o consenso e parceiros de luta, sejamos cautelosos nas manifestações e assim iremos conquistar grandes vitórias.

CAPÍTULO V – ESTUDOS E PROPOSTAS


Tendo em vista que o punk frequentemente se encontra em ideais anárquicos, é necessário estudo a respeito da luta anarquista na história. Muitas pessoas se dizem punks e anarquistas sem ao menos entender questões importantes como a descentralização das formas de produção, a diferença entre comunismo-libertário e comunismo, a relação entre trabalho e emancipação social, a importância da luta das mulheres para a sociedade, a questão de condição sexual etc.

O anarquismo vai muito além de ser contra o governo, o Estado ou qualquer outra forma de opressão. O anarquismo, além da luta libertária e antifascista, é estudo, ação, é respeito, é a busca de informações, é pensar por si, é ter argumentos e soluções para sugerir, é repensar atitudes, é ter convicção em uma ideia, é a sensibilidade e a solidariedade, é a curiosidade pelo desconhecido, é ir atrás de evoluções. Ser anarquista é saber olhar além!

Um idealista libertário que não busca estudar a própria luta libertária não poderá se desenvolver enquanto militante.

Só através de estudo é que podemos conhecer as raízes das desigualdades e conhecer novas formas de lutas.
Quando digo estudo, não falo apenas em livros. É importante buscar informações em diversos lugares. Tanto em livros como em fanzines, documentários, leituras, artes etc.

Quanto mais interesse um militante tiver, mais poderá contribuir com a luta social e poderá sugerir novas propostas de ação.
A dica, então, é: leia, busque, se informe, adquira mais cultura!

CAPÍTULO VI – SOBRE CENTRALIZAÇÃO E SECTARISMO

Eis um ponto muito discutido e ainda assim muito delicado no movimento punk.
O punk é uma alternativa, é uma expressão contra os padrões impostos (sim, é sempre necessário lembrar isso, já que algumas pessoas ainda não entenderam o real intuito do punk) e, sendo uma alternativa, obviamente não é a única forma de expressão aceitável e cabível.

Alguns “punks” pensam que a rebeldia direcionada e a contraposição do sistema é exclusividade do movimento punk. Algo muito estúpido de se pensar e uma forma muito ignorante de agir, já que temos conhecimentos de diversos movimentos e culturas que confrontam as opressões, como por exemplo o hip-hop, coletivos artísticos, pessoas autônomas idealistas etc.

Falando mais da cena punk, as divergências entre pensamentos a respeito da forma de agir, de campos de atuação, entre outras diferenças, acabaram criando segmentos dentro do próprio movimento punk. Isso contribuiu, em certo aspecto, para a dissolução da união entre os militantes.

Se o punk, em sua essência, é libertário, antifascista, contracultural e solidário, temos que saber aproveitar as diferenças individuais de cada punk para que possamos agir cada um em seu campo de atuação, aumentando efetivamente a presença de um movimento libertário em tantos e tantos campos sociais.

Criticar um punk porque este não é violento, ou porque é mais ligado à arte, ou então porque escuta outros tipos de som, ou por qualquer outro motivo parecido é a mesma coisa que virar a cara para o povo. Criticar tais atitudes é impedir que o movimento libertário se expanda para outras culturas próximas de nós. Criticar tais atitudes é virar a cara para um mundo multicultural e solidário. O punk, afinal, não preza por um mundo onde caibam diversos mundos? Então foquemos nisso!

Então não devemos centralizar a contracultura. Por centralizar, devemos entender “monopolizar as formas de ação”, afinal, não é só de uma ação que é feita a luta do punk! O punk está presente tanto na contracultura quanto em nós como pessoas, cada um com suas diferenças, cada um com seus gostos e lazeres, com seus ativismos e seus “rolês” (que podem ser gigs, bares, museus, parques ou qualquer coisa que se possa fazer).

O conhecimento de que existem outras culturas e outras formas de pensar ajudam não só o movimento punk e libertário, mas também a sociedade como um todo.

E tão importante quanto a percepção de tais diferenças na sociedade, é a ciência de que dentro do movimento punk existe muito preconceito entre os próprios punks.
Todos os punks – punks em essência, ideia, mente e coração – são antifascistas, contra todo tipo de preconceito, seja racial, de gênero, sexual etc. Então porque criticar companheiros da própria luta?

Quando o punk abarca em seu ideal as propostas libertárias e anarquistas, a intenção é produzir coisas em prol de todos. Mas parece que muitos punks não entenderam isso e fazem do anarquismo uma guerra ideológica contra libertários com pensamentos diferentes!

Punks independentes, punks do subúrbio, anarcopunks, punks straight-edges libertários, todos são punks! Todos são antifascistas! Todos estão na mesma luta! Não há nada mais ridículo do que tretas entre esses punks, sendo que todos fazem parte do mesmo movimento, da mesma ideia, da mesma vontade de melhorar a sociedade! Novamente torno a falar: existem diferenças apenas no modo de agir, mas a intenção é a mesma! Então para que censurar (censura é algo um tanto repressor para ser visto dentro do movimento punk, vocês não acham?) o companheiro que está travando sua batalha em um campo distinto? Pense bem: se você age num campo e outro punk age em outro campo, isso significa que o movimento punk está marcando presença em vários campos diferentes! Então, vamos parar com essa ideia de que “tal punk” não presta, que “punk fulano” não age onde deveria etc.

Se cada punk estiver produzindo, seguindo a luta libertária, sem caminhar rumo ao fascismo, então devemos todos nos solidarizar!

E mais uma coisa: “punks” que andam com carecas e skinheads fascistas, “punks” que se dizem apolíticos e só pensam em rolê, “punks” que acham que ser punk é sair por aí e brigar com qualquer um porque brigar é uma “puta atitude”, “punks” que acham que basta vestir uma roupa chocante e conhecer o maior número de bandas, esses “punks” não passam de fascistóides idiotas, ignorantes que nunca estiveram dispostos a evoluir e fortalecer o movimento.

Os punks sempre estarão se posicionando contra as injustiças. CONTRA AS INJUSTIÇAS, não contra os próprios punks.

CAPÍTULO VII – O PUNK E SUAS VISÕES DISTORCIDAS

Falei um pouco sobre a importância de não centralizar a luta libertária e sobre o perigo de se tornar sectário perante às diferenças individuais. Devemos também nos atentar sobre pessoas que ingressam dentro do movimento punk sem saber de fato o que é nossa ideologia e nossa cultura.

Nós punks temos uma inimiga fundamental que distorce o verdadeiro ideal que carregamos e atrai algumas pessoas de má fé para junto de nossa contracultura. Essa inimiga é a mídia corporativa. Através de falsas informações, matérias sensacionalistas e infundadas, distorção dos fatos e outras artimanhas com apoio governamental e estatal, dignas de inquisidores que perseguem o povo que se insurge perante as injustiças, a mídia acaba passando a visão de que os punks são baderneiros sem intuito, desorganizados, rebeldes sem causa, bandidos.

Infelizmente, muitos jovens acabam acatando o que a mídia empurra. E o pior: se interessam por essa visão distorcida do punk! E saem por aí com roupas extravagantes, xingando a tudo e a todos, brigando sem quaisquer motivos. E acham que isso é ser punk.

E a distorção não para por aí. Existem pessoas que tem conhecimento sobre o punk, mas na hora de agir, agem completamente diferente do que pregam, do que o punk propõe. É a velha história da hipocrisia.

Ser punk não é ser sujo e malvado, colar na frente de galerias e intimar pessoas que passam, beber até cair porque isso é “subversivo”, bater nos outros sem razão... Não! Ser punk não é isso!

E aos que pensam que para ser punk é preciso ser assim, esqueçam! Para ser punk não é necessário ser malvado, mal-encarado, grosseiro, sujo. Ser punk é ser você mesmo. Pode ser sensível ou não, pode falar formal ou coloquialmente, pode ser uma pessoa mais rude ou mais calma. O que vai te fazer punk é a atitude e a vontade que você tem em não acatar opressões e em mudar a sociedade!

Existe tanto punks mais agressivos quanto punks mais delicados. Cada vivência é única!

Punks nunca usam da violência sem que haja uma justificativa para tal ato. Aliás, é importante registrar que a maioria dos punks não utilizam a violência como forma de propagar ideias. Claro que em todos os meios, seja no meio punk ou não, existem pessoas violentas. Mas isso não é  característica do ideal punk em si, mas sim da individualidade e da experiência de vida de cada punk, que pode ou não recorrer à violência de alguma maneira. Nesse caso, vale ressaltar que a violência é sempre empregada contra o fascismo, nunca contra o povo oprimido.

Àqueles que estão no punk por que acham que é uma postura de gente brava que impõe medo, por favor, não gastem seu tempo! O punk é união e solidariedade, portanto, uma demonstração de cordialidade para com o próximo.

CAPÍTULO VIII – SOBRE DROGAS E CONSCIÊNCIA


“Punks... São um bando de drogados!”. Comum ouvir essa frase, não é mesmo? Mal sabem as pessoas que nem todos os punks usam drogas, aliás, é algo muito ilusório relacionar o movimento punk com as drogas. O que quero abordar aqui é a relação entre a individualidade do punk que faz uso dessas substâncias e a militância enquanto punk ativista.

Sim. Existem punks que usam drogas. Mas isso está longe de ser regra (com o perdão da palavra, afinal, punks e regras não se conciliam). Existem muitos punks que não usam drogas e podemos citar os straight-edges (punks e pessoas ligadas à contracultura que não usam nenhum tipo de droga recreativa, tanto lícitas quanto ilícitas).

Quanto aos que usam drogas, certamente é um direito que cada um tem de usar sua mente e seu corpo como quiser. No entanto, alguns punks que se drogam não se atentam para certos fatos que implicam na organização e propagação da ideia libertária. O exemplo mais preciso é o consumo de bebidas alcoólicas e outros entorpecentes momentos antes e durante as manifestações. Em capítulo anterior, já abordei sobre a necessidade de organizar com antecedência as manifestações, evitando dispersões e divergências inesperadas. Tão importante quanto essa organização prévia é a atenção para que não se abuse do consumo drogas no momento de protestar.

Sabemos que entorpecentes mexem com o psicológico, podendo relaxar ou exaltar aquele que os utiliza. É importante, durante uma manifestação, manter a consciência sob controle, direcionando a atenção nos atos e no protesto. Portanto, uma maneira de evitar imprevistos é não abusar drogas antes ou durante as manifestações. Para quem usa entorpecentes, fica a sugestão de tentar usar somente após os atos, para que ninguém saia prejudicado e para que a manifestação seja mais proveitosa.
Depois das ações, cada um fica sujeito a aproveitar o dia como bem entender, sempre respeitando o próximo.

Além das manifestações de ruas, passeatas e protestos, vale a pena falar a respeito dos squats. Squat é a invasão e ocupação de uma propriedade privada inutilizada com o intuito de se criar centros comunitários e culturais para a sociedade.

Os squats são de extrema importância para o movimento libertário, já que é um ataque direto à propriedade privada, transformando um imóvel particular abandonado em um centro cultural coletivizado para o povo. É como pegar de volta o que nos pertence: o direito ao acesso à cultura, a partilha de conhecimentos e meios de produção, a quebra da lógica capital, a derrubada de um símbolo de desigualdade social.

Por se tratar de um ataque ao maior símbolo capitalista (a propriedade privada), é necessário ter cautela ao administrar um squat, principalmente quando ainda em processo de ocupação.

Nos squats, normalmente se encontram pessoas que passam a residir no local após a ocupação, já que é necessário que alguém tome conta do local quando este não estiver em atividades. Pode ser feita uma rotatividade de participantes, onde cada noite alguém toma conta do squat. Enfim, as formas de se organizar a estrutura de um squat podem ser várias. Mas é necessário que se tenha seriedade e consciência.
Quero propor reflexões a respeito do consumo de drogas dentro dos squats. Como cada caso é um caso, deixarei questões em aberto, levando em consideração que ainda estamos dentro de um sistema que pune judicialmente o porte de drogas:

- Se o squat tem como principal foco um centro cultural comunitário, é cabível assumir o risco de guardar ou utilizar drogas no local ?
- No squat, é comum a visita de crianças e menores de idade? Se sim, vale a pena correr o risco de perder um espaço social por conta de entorpecentes encontrados?
- Existe algum outro lugar onde o squatter possa usar suas drogas sem ser dentro da ocupação? Se sim, por que não usar fora do squat?

São algumas questões em aberto, para que se discuta uma forma de minimizar as consequências de uma desocupação e de um despejo, além de evitar desgastes desnecessários.

Como podemos ver, a questão entre militantes e drogas é bem delicada e precisa de atenção e consciência de todos os que estão ligados à causa libertária.

CAPÍTULO IX – A RUPTURA COM O PRECONCEITO


Solidariedade, união, justiça, antifascismo, consciência, respeito, responsabilidade, autonomia... São algumas palavras frequentemente pronunciadas por punks. Não por menos, já que o punk carrega em si todas essas expressões e sentimentos. Pelo menos na teoria. Na prática, as coisas nem sempre acontecem como deveriam...

O início do movimento punk no Bra$il, por exemplo, foi conturbado e passou por momentos de conflito interno até se estabilizar. Exemplo disso eram as brigas entre punks da cidade e punks do subúrbio. Com o tempo, o punk foi tomando consciência de que esse separatismo e esse regionalismo afastava-o do objetivo libertário. Era necessário romper com essas barreiras, bradar a união entre punks de todas as regiões, construir um movimento mais sólido e efetivo. E então, esses desentendimentos foram diminuindo.

Infelizmente, hoje em dia ainda existem casos de separatismo dentro do movimento punk, como se um punk de “tal região” fosse mais punk do que o sujeito de “região tal”. Que diabos é isso de “mais punk”?

Estamos todos na mesma cena! Ninguém aqui está concorrendo ao prêmio de “Mr. Punk” ou “Miss Punk”. Ser punk não é status, motivo de orgulho ou algo do tipo. Ser punk é motivo para protestar e conscientizar!

O punk é cultura de rua porque é nas ruas que podemos passar informações ao próximo. É indo às ruas que criamos diálogos com a população. É ilusão achar que punks devem ser necessariamente de áreas periféricas, de regiões centrais ou de alguma região específica. O punk não depende de regiões, depende da consciência em querer a igualdade entre todos os cidadãos! Então fica claro que regionalismo é uma forma estúpida de distorcer a luta libertária. O movimento libertário abomina o regionalismo e as fronteiras que só servem para separar o povo do povo e incentivar as guerras estatais.

Então, o ideal é viver a união e o respeito que tanto defendemos. Mas não se esqueçam que esse respeito não deve ser só entre os punks. Respeito ao próximo é primordial em qualquer situação, pois é com respeito que construiremos uma sociedade mais justa para todos.

Isso nos remete a um assunto de suma importância: a questão LGBTQI+. Não sei o que acontece com alguns “punks” de hoje em dia que se opõem de forma estúpida à pauta. Essa homofobia existente em alguns “punks” acaba passando uma ideia totalmente errada para a sociedade.

Ei, homofóbico! Você se acha punk? Sinto te informar, mas você não passa de um fascista repressor. Pode dar a mão aos carecas e explodir junto com eles!

Se o punk é a favor do respeito, do amor entre as pessoas, da união, se o punk é contra dogmas estabelecidos por uma sociedade repressora, então dentro do punk não cabe a homofobia. Se você é homofóbico, nem pense em ingressar ao movimento, ok? Ok!

Aliás, vale lembrar que dentro do movimento punk existe, obviamente, homossexuais. O punk é aberto para todos que se opõem ao sistema e padrão vigentes. Isso inclui gays, heterossexuais, negros, brancos etc.

Por isso mesmo devemos descartar qualquer forma de preconceito, pois o preconceito é um tiro no movimento punk. O preconceito é inimigo do punk!

CAPÍTULO X – AS MULHERES PUNKS E AS QUESTÕES FEMINISTAS


O mundo segue em seu sistema hierárquico, desigual e explorador. Podemos apontar diversos males que esse sistema nos traz: monopólio dos meios de produção, desigualdade econômica, devastação do meio ambiente, fome, preconceitos, repressão estatal, escândalos políticos, alienação da massa, guerras – civis, territoriais, religiosas e por lucros –, escravidão, trabalho infantil, menores abandonados... se formos falar de todos os problemas, poderemos escrever um livro à parte. Dentre tantos problemas, irei falar sobre o descaso para com as mulheres.

É triste saber que apesar das mulheres sofrerem grande violência e abuso da sociedade, ainda assim a causa da libertação feminina por muito tempo não foi discutida como deveria dentro do movimento libertário.

A luta feminista no contexto libertário possui a ideia de que não basta as mulheres alcançarem os mesmos direitos sociais que os homens dentro desse sistema, pois os direitos conquistados dentro da sociedade capitalista acaba perpetuando a exploração de uns pelos outros, o que inclui a própria exploração das mulheres. O feminismo libertário propõe o fim do Estado para uma consciência de fato libertadora, que impossibilite mecanismos que levem à exploração das mulheres pelo sistema patriarcal, potencializado pela estrutura social atual. 

Enquanto a mulher for explorada, agredida, violentada, ignorada e subestimada, então será evidente o quão fadados estamos a seguir hierarquias e preconceitos. Reprimir a mulher é promover o machismo e a hierarquia patriarcal.
Devemos combater o patriarcado! Ele nos diz que o homem é a base da sociedade, que a mulher tem deveres de submissão para com o homem, que o homem deve trabalhar enquanto a mulher deve servir à casa. É exatamente o que o governo faz com o povo: submete a massa a seus caprichos e exploração!

Dentro do movimento punk vemos o descaso que as mulheres vêm sofrendo. Tratadas apenas como “garotas do rolê”, não são vistas como militantes libertárias por uma parcela do movimento. A luta da mulher punk é importantíssima, já que a sociedade só alcançará a emancipação social caminhando lado a lado, mulheres e homens, em união pelo mesmo fim!

A mulher punk representa de forma extraordinária a força contra os padrões impostos, contra a beleza padronizada pela moda, contra o fascismo – já que luta firmemente contra todas as repressões, inclusive o machismo, algo que realmente precisa ser combatido. A mulher punk representa que é possível construir, através do feminismo libertário, uma luta onde mulheres produzam bons frutos pela emancipação social.

Solidariedade ao feminismo libertário! Solidariedade às mulheres!

CAPÍTULO XI – A SOCIEDADE LEIGA X IMEDIATISMO NA MILITÂNCIA


O principal campo de ação de um libertário é a conscientização e a propagação do ideal. Quando falamos de conscientização, estamos falando sobre passar informações para pessoas que ainda não as têm.

A sociedade, em geral, nunca se questionou sobre muitas questões que o punk geralmente questiona. E por isso a propagação para essas pessoas deve ser de forma delicada e cautelosa.

A princípio, a sociedade se assusta com o ideal libertário, pois para muitos indivíduos, a noção de viver sem governo e sem Estado soa absurda. Mas é importante levar à discussão novas formas de organização, pela formação de associações e federações que propõem atender de forma mais satisfatória toda a população (para mais informações a respeito de organizações horizontais, busque livros de autores anarquistas). O problema é que as pessoas, em sua maioria, nunca leram a respeito de organizações autônomas (aliás, se você é punk e não sabe o que é federalismo libertário, fica a dica de procurar a respeito. Essas informações lhe darão muito mais basepara prosseguir a luta. E se você não é punk e desconhece o federalismo, vale a pena ler sobre o tema também). Como o povo desconhece a organização libertária, não podemos passar nossas ideias de forma subjetiva. Qualquer palavra mal colocada pode voltar a população contra os libertários, por simples mal entendido.

Não adianta querer ser imediatista, apontar o dedo na cara, falar dos erros dos outros. Pare para pensar: em 90% dos casos, as pessoas não tem noção de que estão cometendo atos que favorecem o Estado, enquanto esse mesmo Estado está organizado para perpetuar desigualdades e opressões. 

E atenção para o que vem a seguir: o punk nunca foi, não é, nunca será e nem deve ter a pretensão de ser o dono da verdade. Acha que só porque você é punk tem mais moral que outro cidadão? Deixa de ser egocêntrico! Ninguém é obrigado a aceitar suas opiniões. Justamente por isso não devemos nunca apontar o dedo e “censurar” os erros alheios. O que devemos fazer é sugerir novas formas de ação, sugerir a reflexão de seus atos. SUGERIR!

Do que adianta falar mal de quem é consumista, de quem é egoísta, de quem concorda com a política atual se ao falarmos mal perdemos a chance de SUGERIR novas ações a essas pessoas?

Com o imediatismo acabamos repelindo a sociedade da luta libertária. Quem se sentiria à vontade de participar de ações onde os militantes são cheios de si, falam mal dos outros, criticam, não dão apoio, arrumam confusão e não pensam no lado dos outros? Eu, como cidadão comum, certamente não me sentiria à vontade, como não me sinto à vontade com o Estado, que funciona através dessas "lógicas" e incentiva tais posturas.

Devemos saber entender o ponto de vista dos outros. Isso não significa concordar com suas ideias. Significa refletir, se colocar no lugar do próximo, pois só assim poderemos balancear as posturas, podendo sugerir ações em consenso. Devemos ser "psicólogos" e militantes, devemos ser ouvintes e oradores!

Se conseguirmos manter um debate saudável, sem agressões verbais, com uma pessoa que pensa diferente de nós, mais conseguiremos encontrar caminhos e argumentos para contrapor as ideias repressoras. É questão de lógica: ouça os argumentos inimigos ou leigos, aprenda a se defender dessas objeções. Para o libertário convicto, não há objeção que destrua o ideal!

Portanto, temos que cuidar para não nos exaltar em debates, pois isso tira nossa razão e nos torna pessoas que não sabem se portar diante de diálogos e diferenças.

Temos consciência de nossas ideias. Temos consciência de que muitos não têm informações que nós temos e temos a consciência de que é normal que as pessoas se oponham, a princípio, ao nosso ideal. Mas com determinação, paciência e respeito conseguiremos divulgar de forma mais sensata o ideal libertário.

O povo irá adquirir consciência aos poucos, assim como nós, que fomos aprendendo um pouco a cada dia dentro de nossa militância. E continuamos aprendendo, inclusive com as pessoas que nós mesmos julgamos leigas.

CAPÍTULO XII – LIBERTAÇÃO HUMANA E ANIMAL


Mulheres, homens, crianças, idosos... Todos explorados! Todos destratados perante esse sistema! Somos usados apenas como meio de satisfazer os interesses de grandes capitalistas, praticamente (ou literalmente) escravizados, sem possibilidade de escolhas, sem possibilidade de participação em importantes decisões.

O sistema nos prende, nos faz servi-lo, nos direciona ao caminho da dor, do sofrimento e da morte.

Durante toda a história nos deparamos com abusos de poucos privilegiados sobre uma maioria de desfavorecidos. Por aqui, esse mecanismo ainda acontece. É por meio da exploração das classes mais desfavorecidas que aqueles que detêm o poder mantêm seus privilégios, pelo abuso da autoridade, pelo monopólio dos meios de produção, pelo uso da Lei de forma desigual. 

Carregamos o fardo de episódios históricos nos quais a subjugação de povos desprivilegiados foi utilizada como catapulta para os interesses alheios.  Podemos citar o massacre europeu aos nativos do continente americano na época da colonização, a escravidão de negros em séculos passados, a perseguição de judeus pela política nazista alemã, a violência aceita e dogmatizada do homem contra a mulher em diversos campos sociais – incluindo campos religiosos –, entre tantos outros casos. E seguimos nos organizando como sociedade com a herança, muitas vezes inconsciente, de toda essa opressão. 

E como se não bastasse tanta exploração de um ser sobre outro, quando deveríamos caminhar todos juntos pelo bem geral, ainda assistimos o mundo e sua diversidade serem devastados! Vemos o meio ambiente sendo destruído para que esse sistema desigual seja expandido, para que mais seres sejam explorados, para que mais capitalistas ganhem fortunas enquanto milhares sofrem e às vezes nem têm o que comer! Hoje respiramos ar poluído, sofremos com o aquecimento global, sujamos e ignoramos a natureza, tudo por conta de um sistema que não nos permite viver em harmonia com os seres e com o mundo.

A essência do punk deve estar em oposição a tudo isso! O punk não pode se conformar que tantos seres sejam explorados para satisfazer os interesses de poucos! O punk não pode se conformar com a destruição de um mundo que pode ser aproveitado e cuidado por todos!

Eis que entro em um ponto ignorado ou desrespeitado por muitos punks: a questão da libertação animal em prol dos ideais libertários.

Quando falamos em acabar com as desigualdades e com o preconceito, contra a exploração e contra a devastação do meio ambiente, torna-se necessário olhar com atenção para a causa animal.

Assim como os seres humanos, os animais também têm sentimentos, sentem medo, dor, afeição e tantas outras coisas que todos os seres sencientes (seres vivos que possuem a capacidade de ter sentimentos e sensações) possuem. Não é porque os animais não sabem falar ou não possuem polegar opositor que eles são inferiores. As pessoas certamente não explorariam/matariam um bebê só porque este não sabe falar ou usar suas capacidades motoras. 

Assim como vivemos explorados, em luta constante pela sobrevivência, e queremos nos afastar das heranças opressoras que nos foram deixadas ao longo da história, podemos estender essa consciência aos animais. Não há distinção! Os humanos aprisionam animais, maltratam, exploram e os utilizam da forma que bem entendem, sem levar em conta as dores que causam a estes animais e o direito à vida que eles possuem.

Especismo (a ideia de que uma espécie de vida é superior à outra) também é opressão.
Para que causar dor e exploração a alguém quando podemos e devemos lutar por alternativas?

E o problema não para por aí! Se nós, libertários, nos importamos com a preservação do meio-ambiente e com a fome mundial, é ainda mais absurdo virar a cara para a causa animal! A criação de gado e de animais de consumo, além da violência, causam o desperdício de recursos, espaço, água e energia, levando a maior dano ambiental e, consequentemente, à queda na qualidade de vida de animais humanos e não-humanos.

A questão da libertação animal não se trata de uma dieta. A dieta vegetariana não é a luta em si. É apenas uma consequência de uma luta que busca findar a exploração animal e a lógica da opressão de um sobre o outro. 

Nós, libertários, não podemos nos habituar a quaisquer tipos de repressão, massacre e exploração que sejam! A exploração animal não combina com o ideal libertário, querendo ou não. É necessário saber enxergar isso!

Ok. Se você é libertário e não quer militar pela libertação animal, é uma escolha sua. Mas pense muito bem antes de criticar um ativista da causa animal, pois ele pode estar sendo muito mais coerente em seus discursos e atitudes que você.

CAPÍTULO XIV – O IDEAL LIBERTÁRIO NOS DIAS ATUAIS

“Mas vocês acham mesmo que vocês vão conseguir mudar alguma coisa?” é o que nos perguntam a toda hora. A minha resposta? “Já mudamos e estamos mudando!”.
As pessoas não entendem que o libertário busca, sim, a mudança social, mas tem consciência de que isso é algo a ser muito bem trabalhado que leva anos, décadas, talvez séculos, e provavelmente não estaremos vivos quando as grandes mudanças sociais chegarem.

No entanto, o que vale a pena dizer é que, mesmo que não acompanhemos essas mudanças de perto, durante nossas vidas e nossa militância como libertários conseguimos nos opor à exploração, fizemos nossas vozes serem escutadas, não nos resignamos, tentamos melhorar tudo aquilo que se fez possível, vivemos a vida da forma mais alternativa e independente que conseguimos!

Mesmo que não acompanhemos as grandes mudanças sociais de perto, nós temos a felicidade e a satisfação de ter promovido eventos culturais, passeatas em prol do povo, fanzines e materiais informativos para a população, adquirimos mais conhecimento através de leituras e da vivência, conhecemos e nos confraternizamos com outras pessoas, nos divertimos e fizemos grandes amizades... Isso tudo é uma grande e importante mudança! São mudanças pessoais que refletem no âmbito social sem sombra de dúvida!

Sim! Nós acreditamos num mundo livre das amarras capitalistas, onde todos viverão em cooperação e solidariedade, sem desigualdades sociais. Nós lutamos, sim, por esse mundo! Mas o mais importante de tudo é que nós, punks e libertários, não abaixamos a cabeça para todo esse caos que se apresenta.

Mesmo que, atualmente, não estejamos vivendo numa sociedade libertária, dentro de nós carregamos as sementes e a vivência que nos tornam ingovernáveis!
As mudanças começam dentro de cada um.

CAPÍTULO XIII – A BUSCA POR CULTURA E O MUNDO DIVERSO

“Por um mundo onde caibam diversos mundos”. Este pensamento define bem o ideal libertário e a essência do punk.

O punk tem sua cultura caracterizada pelo visual, pela produção de fanzines e por sua música anticomercial – música essa que qualquer um pode fazer por não exigir estudo instrumental e ser produzida de forma independente. Para conhecimento, foi assim que surgiu o hardcore –, fazendo do principal lema punk o Faça Você Mesmo (Do it Yourself).

No entanto, sabemos que são características que não prendem e nem devem prender o punk. O punk é livre para conhecer e apreciar outras culturas, músicas, ideias, pois assim podemos expandir o círculo social e a interação com outras pessoas ou até mesmo descobrir ligações entre outras culturas e o ideal libertário.

Já foi citado aqui que qualquer forma de preconceito é inconciliável com o punk. Também foi citada a importância de entender o ponto de vista de outros indivíduos, sempre focando o respeito e o ideal antifascista.

Portanto, aos que pensam que para ser punk é necessário ouvir hardcore, repudiar o som de um pandeiro, detestar a melodia de um violino, não escutar outras músicas havendo interesse, ir a gigs e não frequentar espetáculos artísticos diversos, enfim, a essas pessoas que pensam assim, afirmo que estão equivocadas!

O punk é multicultural! Além de sua contracultura peculiar, o punk, por ser um movimento popular, deve considerar receber e estar junto ao povo em diversas manifestações culturais. 

O importante para o punk é não se afastar de seus ideais libertários. Não importa os lugares que os punks frequentam, as músicas que eles escutam, as roupas que eles vestem, contanto que nunca se afastem de sua essência e sempre lutem contra a exploração e contra o fascismo.

Aproveitemos, então, todas as culturas que nos são de direito! Todas as culturas que são do povo! Todas as culturas que nos fazem estar em um mundo onde caibam diversos mundos!

A interação com a população é essencial para a união e para o contato com novas e importantes sensações.

CAPÍTULO XV – A CONSCIÊNCIA ALÉM DO PUNK




O mundo não precisa do punk. O punk é que precisa do mundo. O ser vivo precisa do mundo, de um mundo livre de crueldades! É muita pretensão achar que só porque somos punks temos mais atitude do que outras pessoas. É muita pretensão achar que só porque somos punks vamos mudar o mundo. Há milhões de pessoas fora do movimento punk que também contribuem com um mundo mais ameno, mais justo!

E vale lembrar que antes de sermos punks somos seres humanos. Temos nossas consciências que nos levaram a lutar por um ambiente melhor, e então nos encontramos no ideal punk.

Preciso dizer também que não existe o fato de “virar punk”. Quem “vira” punk pode “desvirar” a qualquer hora. Ninguém escolhe ser punk. Ninguém acorda e diz “hoje quero ser punk”. Nós nos descobrimos punks, nós nos encontramos dentro do ideal libertário e dentro da contracultura, nós nos vimos dentro desse contexto. Ser punk é uma condição, é algo que está dentro de nós!

Não temos a pretensão de buscar um mundo punk, claro que não! Assim como nós nos encontramos na contracultura punk, outros indivíduos se encontram em outras culturas. E eis a graça da diversidade! O importante é manter essas diferenças culturais em harmonia, sem desrespeito e sem apoiar o sistema opressor!

Existe um mundo cheio de surpresas e conhecimento dentro do punk, mas fora dele também há outros mundos tão cheios de beleza quanto a própria contracultura que defendemos!

Aproveitemos nossas vidas, buscando sempre o bem-estar e a ruptura com as desigualdades!

O PUNK ESTÁ VIVO e enquanto houver injustiças a combater, culturas para se conhecer, lazeres para aproveitar, então o punk continuará sua estrada!

Se nós mesmos não matarmos o punk, então ninguém mais matará! ÊRA PUNK! RESISTÊNCIA LIBERTÁRIA!

Paz, Saúde e Anarquia!

Esse documento foi escrito por Mao Punk, em julho de 2010, revisado e atualizado em 2021.